Em meio a queimadas que já destruíram 100 mil hectares no estado, Rio Branco volta a ter pior qualidade do ar entre as capitais

Concentração de partículas no ar da capital acreana teve mais que o dobro do índice alcançado pela segunda colocada, Porto Velho. Especialista alerta que 2...

Em meio a queimadas que já destruíram 100 mil hectares no estado, Rio Branco volta a ter pior qualidade do ar entre as capitais
Em meio a queimadas que já destruíram 100 mil hectares no estado, Rio Branco volta a ter pior qualidade do ar entre as capitais (Foto: Reprodução)

Concentração de partículas no ar da capital acreana teve mais que o dobro do índice alcançado pela segunda colocada, Porto Velho. Especialista alerta que 2024 pode ser o pior ano em relação a queimadas no estado. Densa camada de fumaça voltou a se intensificar nas ruas da capital acreana nesta quinta-feira (19) Victor Lebre/g1 Em meio a queimadas que já destruíram 100 mil hectares de vegetação em todo o estado, a capital do Acre, Rio Branco, voltou a ter a pior qualidade do ar entre as capitais brasileiras nesta quinta-feira (19). De acordo com a plataforma suíça IQAir, que utiliza sensores instalados em diversas localidades do planeta, a capital acreana tinha concentração de partículas de 310 μg/m³ (microgramas por metro cúbico) às 9h. 📲 Participe do canal do g1 AC no WhatsApp O número é mais que o dobro do índice alcançado pela segunda colocada, Porto Velho, que tinha 130 μg/m³ no mesmo horário, e também é 20 vezes acima do considerado aceitável pela Organização de Saúde (OMS), que é de 15 μg/m³. Mais cedo, às 8h, a situação era ainda pior. O mesmo monitoramento mostrou que Rio Branco tinha concentração de 491 μg/m³. LEIA TAMBÉM: Queimadas ferem e matam cerca de 400 animais silvestres no Acre Os números, ainda conforme a plataforma, se classificam como “insalubres”. Na terça-feira (17), a concentração de material particulado ainda era considerada insalubre, mas estava em 238 μg/m³ número 8,8 vezes acima do índice apontado pela OMS, mas menor que o registrado nesta quinta. Desde o dia 2 de setembro, o estado está encoberto por uma densa camada de fumaça causada pelas queimadas que têm ocorrido não apenas no Acre, mas também nos estados vizinhos, Amazonas e Rondônia, e nos países vizinhos, Peru e Bolívia, e se estabeleceu como uma das mais poluídas do país. Levantamento aponta que incêndios já atingiram mais de 100 mil hectares no Acre Quais as causas de tanta fumaça? Segundo a pesquisadora, professora da Universidade Federal do Acre (Ufac) em Cruzeiro do Sul e membro da Academia Brasileira de Ciências (ABC), Sonaira Silva, a principal origem da fumaça que encobre boa parte dos municípios acreanos vem do preparo de pastagens. A especialista, que tem diversas pesquisas relacionadas a queimadas, porém, os incêndios florestais também estão contribuindo para que 2024 tenha um cenário intensificado de queimadas. Conforme o monitoramento via satélite do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), o Acre já registrou 2.688 focos de queimadas no mês de setembro. O número corresponde a 87% do acumulado do mês inteiro no ano passado. Para a professora, este ano pode ser o pior nos índices de incêndios. De acordo com estudos atuais, Sonaira afirma que já foram destruídos mais de 100 mil hectares de vegetação este ano até o início de setembro. “A gente teve vários momentos de seca extrema, de picos de queimada muito altos, como desde 87, 1998, 2005, 2010. Mas, geralmente, eles eram concentrados no leste, oeste, ou ali na parte central [do estado]. Então, não ocorriam de forma intensa em todo o Acre. O que a gente está vendo em 2024, pode ser um dos piores, ou até o pior ano. Está com um nível de queimada muito forte no estado inteiro, inclusive com incêndios florestais. Se a gente pensar num fogo de pastagem ou de desmatamento, o principal município é Feijó e Tarauacá, Cruzeiro do Sul. Mas, se a gente pensar no incêndio florestal, o fogo que está entrando na floresta, a gente tem municípios do Juruá e do Vale do Acre”, ressalta. LEIA MAIS: Força Nacional é autorizada para combater e investigar causas de incêndios florestais em Feijó, no Acre Incêndio atinge 500 hectares e prejuízo ultrapassa R$ 1 milhão em propriedade no Acre Imagens fortes: Incêndio queima área de oito hectares de vegetação, fere e mata animais na capital do Acre Com mais de 5 mil focos de queimadas no ano, multas por crimes ambientais ultrapassam R$ 15 milhões no AC Os municípios que formam o Vale do Rio Juruá registraram, em um curto período de tempo, um número elevado de queimadas e que chegaram a grandes proporções. Em menos de 10 dias, dois incêndios atingiram trechos do Parque Nacional da Serra do Divisor, em Mâncio Lima, no início de setembro, com mais de 100 hectares de floresta destruídos. No mesmo período, um outro incêndio atingiu uma área de mata na Vila Petencostes, em Cruzeiro do Sul, destruiu pelo menos 15 hectares de vegetação. “Quando o fogo entra na floresta, a gente tem um prejuízo não só pra biodiversidade e ecologia dessa floresta. A gente fez um inventário em algumas dessas florestas e percebemos que elas não se recuperam mesmo depois de 20 anos. A gente estima que, dependendo do tipo de floresta, o impacto em espécies que a gente usa para construção, dos tipos madeireiros, ou então até as madeireiras, espécies que dão açaí e buriti, artesanato ou medicina, essa quantidade que a gente usa no dia a dia amazônico, pode reduzir de 20 a 100% dependendo do tipo de floresta. As florestas ali da Vila Pentecostes, que é um tipo muito sensível de floresta, endêmica, só existem nessas regiões isoladas, elas não são resistentes ao fogo. A gente estima que ali elas podem ter uma mortalidade de até 50% dessas árvores”, alerta Sonaira. Incêndio atinge 110 hectares de vegetação na Serra do Divisor, no interior do Acre Possível solução Professora Sonaira Silva ressalta a necessidade de discutir o chamado 'calendário do fogo" Reprodução/Rede Amazônica Acre Uma possibilidade apontada pela professora para amenizar o número alarmante de queimadas no estado e, consequentemente, a nuvem de fumaça que encobre as cidades, é discutir o chamado “calendário do fogo”, período em que os órgãos de fiscalização ambiental concedem autorizações para a queimada no campo. As autorizações para uso controlado do fogo estão suspensas desde 25 de julho por portaria do Instituto de Meio Ambiente do Acre (Imac). O uso do fogo, segundo a pesquisadora, vai continuar sendo constante, porque muitas vezes os produtores rurais não têm acesso a novas tecnologias e precisam utilizar as queimadas como ferramenta de limpeza para renovação de lavoura, por exemplo. Com isso, de acordo com a especialista, é preciso levar em conta possíveis períodos de seca extrema, que podem contribuir para a propagação descontrolada dos incêndios. “O fogo ainda é utilizado com uma ferramenta agrícola muito importante, muito usual, não só no Acre mas na Amazônia inteira, para reforma de pastagens, limpeza do desmatamento para fazer roçados. Mas o manejo de pastagem ainda é o que utiliza mais e o que está causando mais fumaça e áreas queimadas. A principal proposta que a gente tem, é que precisa mudar o calendário de fogo, principalmente nesses períodos de seca mais forte. Talvez a gente não vai conseguir eliminar o fogo, porque muitos produtores não conseguem acesso a novas tecnologias, e ainda vã precisar usar o fogo. Mas, que a gente mude esse calendário”, acrescenta. Colaborou o vídeorrepórter Mazinho Rogério, da Rede Amazônica Acre. VÍDEOS: g1